segunda-feira, 27 de janeiro de 2020

Nazismo

Na semana retrasada, o então Secretário da Cultura, Roberto Alvin, fez uma declaração onde parafraseia o Ministro da Propaganda da Alemanha nazista, Joseph Goebbels. Desde então, recomeçou uma discussão sobre nazismo e puxaram o comunismo para a briga. "Nazismo x Comunismo", "Nazismo é de direita ou esquerda?" e "Aquecimento Global/Mudanças Climáticas" são assuntos que aparecem e reaparecem de tempos em tempos, e nada de novo para acrescentar a eles, sempre as mesmas coisas. Aqui, pelo menos, abordo perspectivas que passam despercebidas pelos demais.



A frase parafraseada por Goebbels, 



“A arte brasileira da próxima década será heroica e será nacional, será dotada de grande capacidade de envolvimento emocional, e será igualmente imperativa, posto que profundamente vinculada às aspirações urgentes do nosso povo, ou então não será nada”.


A frase original é:



"A arte alemã da próxima década será heroica, será ferreamente romântica, será objetiva e livre de sentimentalismo, será nacional com grande páthos e igualmente imperativa e vinculante, ou então não será nada”.



Associe isso a um fundo musical composto por Richard Wagner, o compositor preferido de Hitler, e pronto, temos a mais perfeita manifestação do nazismo na mídia e na internet. Sem querer defender o então secretário - critiquei-o por sua política de "produção de cultura conservadora" ou coisa do tipo, como se coubesse ao Estado produzir cultura - mas nazismo não é isso, nazismo é outra coisa, muito pior.



A declaração de Alvim, se desconhecêssemos o autor e sem a tal música de fundo, poderia ser de autoria de qualquer responsável pela cultura de um regime totalitário. Acredito que algum secretário de Stalin tenha dito algo parecido, embora não tenha usado essas palavras, mas nem por isso se tornou nazista. A arte é patrimônio nacional, de qualquer nação, que pode ser controlada por qualquer governo mais assanhadinho, tanto nazista, quanto comunista, ou fascista, ou integralista ou qualquer outro "ista" que imaginarmos. Até bolivarianista e peronista. 



Mas então, Alvim não é nazista? Não sei, só sei que tal declaração não faz de ninguém um nazista, mesmo que acompanhada de uma música que já foi tocada em propaganda de produto de limpeza. O que caracteriza o nazismo é a crença da raça superior - a deles - e o detrimento das raças "inferiores" - todos os demais. No sentido político, o nazismo é aquele regime que persegue preferencialmente judeus e mata-os, mas em essência, qualquer regime que prega a superioridade da sua etnia e o desejo de eliminar os "inferiores" já pode ser considerado um regime nazista. Ou isso, ou ninguém daria atenção ao nazismo.



O regime do Apartheid, na África do Sul, por exemplo, poderia ser considerado um regime nazista: um povo declarado superior que segrega o povo "inferior". Não exterminou parte da população negra - pois o extermínio nazista pode ter sido um projeto político do "Führer", não que faça parte do nazismo - mesmo assim, é um regime nazista. Um "nazismo moderado", por assim dizer, assim como temos o "comunismo moderado" ou um "islamismo moderado". Se a Klu Klux Klan tivesse tomado o poder nos EUA, certamente seria um regime nazista, só não sabemos se iria exterminar ou reescravizar a população negra, mas em essência, eles já são nazistas. Até o governo hutu de Ruanda em 1994 pode ser considerado um regime nazista: uma etnia que perseguiu e prendeu pessoas de outra etnia, e ainda matou 800 mil pessoas em apenas 3 meses, um ritmo superior ao dos nazistas. A grande diferença é que talvez não se tratava de "superioridade" em relação aos tutsis, mas de ressentimento ou vingança. Ressentimento: Hitler usou o ressentimento da população alemã em relação aos judeus, e assim começou tudo.



Em outra postagem, arrisquei palpitar sobre o porquê odiamos o nazismo. Não, não é porque respeitamos a vida - na verdade, muitos odeiam os judeus tal qual os nazistas. Muitas pessoas que são contra a pena de morte são favoráveis a fuzilamentos de "nazistas", por exemplo. O primeiro motivo é que não podemos ser nazistas, e se não podemos ser nazistas, somos alvos deles. Mas nós podemos ser comunistas, e Hitler ousou invadir a sagrada URSS, governada pelo divino Stalin, os únicos que nos aceitam como seus filhos.



Quantas pessoas repetiram essa frase "uma mentira repetida mil vezes se torna verdade"? É uma citação de Goebbels. Então sois nazistas, ou tem que ter a música de Wagner tocando no fundo? Aliás, de tão repetida essa frase e considerada verdadeira, não sei se era uma mentira que se tornou verdade.