Descanso o queixo sobre
meu punho cerrado, observo, analiso, prescruto as reações das
pessoas diante das mortes divulgadas na mídia, começando pelo tio
do último imperador norte-coreano, passando pelo leão, pelo
cãozinho e por outras dezenas de vítimas de todas as espécies ao
redor do mundo, e terminando em algum morro carioca, finalmente chego
a uma conclusão não muito chocante: a indignação – seletiva,
p’rá variar – depende não apenas de quem morre, mas também, e talvez principalmente, de
quem mata, não importando muito suas motivações, até porque, em
caso de dúvidas e de quem mata, pode-se criar uma!!!
Vamos ao primeiro
exemplo, já comentado bem aqui: Israel bombardeia Palestina. Quem foi
bombardeado? A Palestina, mas podia ser uma piscina servindo de
criadouro de mosquitos da dengue que não faria diferença nesse
caso. O diferencial está em quem atacou: Israel. Mas qual o problema com Israel: 1) Trata-se de uma espécie de enclave americano. 2) É um
país idealizado por banqueiros bilionários. Agora, substituam
Israel por Jordânia e tentem imaginar a (falta de) indignação da
elite humanitária. Soubeste dos ataques russos na Chechênia(?) ?
Como reagiste? Pois é...!!!
Um exemplo mais próximo
e individual: um menor é morto. Quem matou? Um policial. Surge a
justa comoção internética. Ops, foi engano: um outro menor o
matou; virou uma unidade perdida entre milhares de corpos espalhados
pelo país. Volta a ser um pixel. Um homossexual é morto por um sujeito
branco? Pronto, surge a justa indignação. Descobre-se, mais tarde,
que foi morto por latrocínio. Pronto, os humanitários se
indignarão, mas pela promoção de sua causa que criou asas. Um negro é
morto por um branco? Racismo, é claro. Foi morto por latrocínio?
“Ah...hm...hã...duas vítimas do sistema”!!!
O esquema funciona mais
ou menos assim:
As “elites”
representam basicamente nesse modelo os brancos ricos, os
conservadores ou aquilo que entendem por conservadores, cristãos
praticantes, americanos brancos de classe média para cima e
“associados” dos EUA, políticos "de direita" e a polícia. Já as “não-elites” são todos os
demais, incluindo os animais. Note que de todas as combinações
possíveis, somente quando alguém “da elite” mata alguém da
“não-elite” haverá indignação!!!
Esse esquema moral não
é novo, na verdade, é uma reformulação do “se fosse pobre,
preto e prostituta já estaria preso”, resquício de uma sociedade
escravocrata oficialmente finda há relativamente pouco tempo. Nesse
caso, temos algo assim:
Note novamente que em qualquer
situação, só há indignação em uma das quatro situações.
Talvez para manter
nossa sanidade em um mundo com cada vez mais mortes divulgadas (o que
é diferente de “um mundo mais violento”), nossa mente acaba
selecionando os tipos de mortes que devemos nos indignar. O problema
são os critérios morais que usamos para tanto, aquilo que chamo de
“elites” e “não elites”!!!
A minha reação diante
de assassinatos é mais ou menos assim:
Escolhi a palavra
“bandidos” para definir qualquer pessoa cujos atos causem algum
tipo de sofrimento a outra pessoa, independentemente de raça, cor, sexo ou classe social. Roubar barras de chocolate no
supermercado não merece mais que uma repreensão, mas roubar o
salário de uma pensionista já chamo de “bandidagem”. No caso de
“não-bandido” que mata outro “não-bandido” é algo raro,
mas depende da situação!!!
O problema, portanto, não é a
indignação seletiva, mas o que motiva a indignação de cada um. Estamos de olho!!!