sexta-feira, 31 de maio de 2019

Olha eu respondendo o Olavão!!!

O sempre polêmico Olavo de Carvalho nunca esteve tão em alta. Desde que o atual presidente assumiu, ele tem se tornado uma espécie de Rasputin tropical, inclusive tendo ministros indicados sendo aceitos pelo governo. Se antes, os satélites estavam captando sinais de "vida" de Olavo, agora lupas são direcionadas nas suas redes sociais, a espera de alguma postagem polêmica.



Nessa semana, ele teria postado no Twitter uma suposta lacuna científica: de que ninguém contraprovou a argumentação dos terraplanistas sobre a retidão da superfície marítima e isso lhe rendeu a pecha de terraplanista. Oh, como não falei sobre essa "teoria" antes? Vou tentar corrigir um pouco desse lapso aqui. Mas bem, voltando ao Olavo terraplanista, essa dúvida deve mesmo encucar muita gente, inclusive aqueles convictos de que a Terra é ESFÉRICA, mas jamais ousariam expôr essa dúvida em público, como fez o Olavão. Que a Terra é redonda até os terraplanistas sabem, mas para eles, é redonda mas plana. 



Tentarei explicar aqui sobre esse aparente argumento terraplanista, de que essa retidão da superfície seria um indício de que a Terra é plana.



Muito bem, vamos do começo, antes da invenção da roda. Vejam essa interessante e complexa figura abaixo:





Essa figura chama-se quadrado. Vejam que ela tem quatro lados retos. Mas o que acontece se apararmos as pontas? Teremos uma figura semelhante a de baixo:





Se apararmos as pontas dessa figura - um octógono - teremos outra figura com mais e menores lados retos. Se apararmos novamente as pontas dessa nova figura, teremos figuras cada vez mais próximas de um círculo, até que finalmente teremos um círculo.






E então, o círculo não tem nenhuma reta? Sim, tem, mas são infinitesimais. Para provar isso, vejamos abaixo:






Essa parte da circunferência que toca a linha reta no Ponto A é a parte reta do círculo. Elementar, se tocou a reta, então também é uma reta. 



Paremos com essa viagem toda e voltemos ao Planeta Terra. A Terra também é uma circunferência, uma circunferência de aproximadamente 40 mil quilômetros, que também possui inúmeras e infinitesimais partes retas. Uma dessas partes retas da circunferência terrestre é essa superfície reta abaixo dos nossos pés e ao nosso redor, que devem ter uns quinze quilômetros de diâmetro e que é delimitado pela linha do horizonte. No caso da superfície marítima, o horizonte parece reto porque a superfície é homogênea, lisa, sem relevos. Infelizmente, não estou a beira do mar para constatar isso de perto, mas se alguém morar junto ao mar ou em alguma planície perfeita e ver se isso procede, agradecerei na minha próxima postagem.



Ao que parece, a dúvida do Olavo se refere apenas a superfície marítima porque na superfície continental isso não é observável devido a sua superfície rugosa, mas fica claro que o que vale para uma superfície rochosa, vale para uma superfície oceânica, e trechos retos não provam que a Terra é plana ou algo do tipo. Questão de geometria.


quarta-feira, 29 de maio de 2019

A meritocracia de Bettina

Estou eu meio que afastado da internet, desde que a tela do meu laptop trincou pela enésima vez em três meses, por isso, só acompanho algumas notícias no Yahoo, um dos únicos sites que consigo acessar no trabalho, ou quando minha mulher me põe a par das discussões nas redes sociais. Recentemente, o assunto da semana foi uma das propagandas da Empiricus sobre como aumentar sua renda, ficar rico, coisas e tals. Uma jovem teria multiplicado em mil vezes o seu pequeno capital em apenas três anos. Acho que é isso. Depois das várias suspeitas sobre tal façanha, houve pessoas, ou uma, que aproveitou a ocasião para falar sobre meritocracia, de novo e de novo. As bobagens de sempre, para manter a tradição, e em nome da tradição, contestarei mais essa bobagem.


Sempre que falam sobre essa tal meritocracia, há a confusão entre inexistência e ausência. No vídeo não foi diferente, pra nada variar. O primeiro grande problema foi associar a meritocracia à ascensão fictícia da jovem, tentando desmentir algo que ela não falou. Caso essa façanha do milhão fosse verdadeira, seria mais uma questão de sorte que de mérito, já que envolvia investimento em ações. A própria moça, a Bettina, sequer fala em mérito, em esforço, em determinação, coisa e tal, e  estava disposta a compartilhar sua experiência com as demais pessoas (desde, é claro, que pagassem uma taxinha irrisória). Associar isso a meritocracia requer um esforço mental tão grande que certamente daria grandes resultados se fosse aplicado em algo produtivo, tornando o sujeito um “merecedor”, ou lhe faltaria oportunidades para tanto?


O sujeito do vídeo fala que a meritocracia favoreceria uma elite, perpetuando as desigualdades sociais. Desculpe-me, mas isso já acontece, mesmo com a “ausência” de meritocracia. Desculpe-me novamente, mas é a ausência de meritocracia que perpetua as desigualdades sociais, pois pessoas talentosas e competentes, mesmo que sejam desfavorecidas pela vida – e elas existem - são deixadas de lado por causa da cor, raça, sexo, preferência sexual, pelo candidato que escolheu na última eleição, ou para dar espaço a alguém incompetente mas bem Quem Indicado. Tais situações são opostas à meritocracia, mas que cinicamente são chamadas de meritocracia.


Sobre a tão cantada em prosa e verso Deve Haver Igualdade de Oportunidades, que discuti em outra ocasião, certa vez vi um filme brasileiro que pretendia passar uma mensagem, mas para quem prestou atenção, apenas corroborou com o que escrevi. O filme Que Horas Que Ela Volta procurou mostrar a desigualdade e o preconceito da elite contra os mais pobres. Mas o que me chamou a atenção no filme, até porque deve ter sido algo não intencional, é que a filha da protagonista, pobre e esforçada, foi aprovada em um vestibular de medicina, enquanto o filho da patroa, mesmo com todas as oportunidades da vida em mãos, foi reprovado. Pela lógica “anti-meritocrática”, o garoto seria aprovado meio que automaticamente, pois tinha todos os recursos para tal, enquanto a moça tenderia a seguir o mesmo destino da mãe, por mais que se esforçasse. “Exceções”, diria alguém que não sabe a extensão dessas “exceções”, ainda que fossem, de fato, exceções, são melhores que nada, certo? E a Igualdade de Oportunidades pode vir com a meritocracia…



Outra coisa que sequer é discutida é o caráter social de uma profissão. Mesmo que a meritocracia favorecesse tão somente Quem Teve Oportunidades Na Vida, no fim das contas, o que nos interessa é a qualidade de seus serviços. Precisamos de bons médicos, bons advogados, bons dentistas e bons qualquer outra coisa, até porque até nossa sobrevivência depende disso, independentemente se tais profissionais ganharam tudo de mãos beijadas ou tiveram que ralar mais que o necessário. Sem um mínimo de meritocracia, Os Que Tiveram Oportunidade Na Vida continuarão ocupando bons cargos, mas não pela sua competência, o que seria desastroso para qualquer sociedade, e é o que ocorre no Brasil hoje, esse exemplo de país onde a meritocracia não tem vez.



A jovem Bettina e a Empirucus podem ser acusados de tudo, menos de espalhar os nobres valores da meritocracia. Brasileiro não acredita em meritocracia; brasileiro acredita na Mega-Sena e em concursos públicos, de preferência federal.